Em diversos posts anteriores comentei sobre um prato árabe que aprendi com minha mãe (que aprendeu com minha avó paterna, proveniente da Palestina), chamado Chich-Barak, mas que foi apelidado pela família de “Orelha de Gato”, (por causa do formato da massa, não sei porque cargas d’água, alguém achou parecido com orelhinhas de gato…).
Este prato tem um significado muito forte na minha família, porque era a “estrela” nas comemorações mais importantes. Sempre foi, na minha infância (e até hoje!), o meu prato predileto. Não só por seu sabor único, como por seu significado de “agregador” da família. Minha mãe nos pedia para estarmos cedo em torno da mesa para ajudarmos a preparar as “orelhas”, que nada mais é que massa recheada com carne moída. Mas como sempre era um evento importante, e minha família é numerosa, a quantidade de massa ficava na casa dos 2, 3, 4 e até 5kg! E antigamente, até os meus 20 e poucos anos, fazíamos manualmente, cada orelhinha, sem ajuda ao menos de um rolo para esticar a massa. Depois que tive meu restaurante italiano, nos idos de 1996, em que eu fabricava a própria massa, tive a feliz idéia de usar o rolo cilíndrico de abrir massas (e um cortador circular para raviólis) no preparo das orelhas de gato, o que facilitou muito. Ainda assim, é preciso que todos colaborem, pois senão acaba-se a nossa famosa tradição, que diz: “se não fizer, não come”!!!!
Nostalgias à parte, vamos ao que interessa. Não há receita escrita por ninguém da família, mas há nosso “olhômetro” na hora de preparar este prato. Por conta disso, nunca nenhum sai igual ao outro e aí ao experimentá-lo, também é tradição dizermos: “essa foi a melhor orelha que já fizemos”. Mas resolvi tentar passar aqui mais ou menos como se faz. Em 15/09/11 postei uma aula de cozinha árabe que tive na UNIRIO quando preparamos uma Chich-Barak com molho de coalhada (confira aqui). Mas aquela não é a que minha vó nos ensinou. Na “nossa” orelha de gato o molho é diferente, é feito com ‘tahine’, uma pasta de gergelim usada para preparar o homus tahine (pasta de grão de bico).
Orelha de Gato
Ingredientes do recheio: 1kg de carne moída de primeira, 1 cebola grande picada, sal e pimenta do reino a gosto (se quiser acrescente um pouco de hortelã picadinha).
Ingredientes da massa: 1kg de farinha de trigo, água e sal.
Ingredientes da sopa: 1,5kg de costela de boi em pedaços pequenos, 10 dentes de alho picado, 2 cebolas picadas, 1 pimentão pequeno picado, cheiro verde picado, sal e pimenta do reino a gosto, azeite, 4 ou 5 limões, 1 lata de tahine (500g).
Modo de preparo:
Primeiro é preciso fazer a massa. Pegue um recipiente fundo e grande, tipo uma bacia. Coloque a farinha de trigo no recipiente e vá acrescentando, aos poucos, água misturada com um pouco de sal, incorporando com as mãos. Até que fique numa consistência bem macia, desgrudando das mãos. Cubra a massa com um pano limpo e levemente umedecido e deixe descansar por pelo menos uma hora.
Faça a sopa. Coloque azeite numa panela grande e funda (caldeirão) e leve ao fogo alto. Inclua as cebolas e metade do alho, deixe dourar levemente. Acrescente as costelas temperadas com sal e pimenta do reino e deixe refogar bastante. Pode baixar o fogo. Coloque o pimentão e o cheiro verde, refogue mais um pouco, acrescente bastante água fria (eu diria uns 3 litros). Deixe cozinhando em fogo baixo até que a costela esteja macia. É necessário repor água de vez em quando, para não secar muito. Tem que ficar com bastante caldo.
Prepare o recheio das orelhas, colocando toda a carne moída em uma panela, com sal e pimenta do reino. Deixe em fogo baixo cozinhando até secar toda a água. Depois desligue o fogo e acrescente a cebola picada e a hortelã (opcional).
Agora vem a parte mais trabalhosa. Abra a massa com ajuda do cilindro, ou de um rolo, numa mesa limpa e polvilhada com farinha de trigo. Faça os círculos com um cortador circular ou com um aro, ou mesmo um copo. Recheie como capeletis, dando o formato de orelhas (primeiro dobra ao meio, como um pastel e depois une as pontinhas, veja as fotos abaixo). Vá colocando-as em cima de um pano polvilhado de farinha de trigo. Deixe-as secando até a hora de mergulhá-las na sopa.
Agora faça o creme de tahine no liquidificador, misturando o tahine com o suco dos limões, sal, um pouco de alho e água. Bata bem e incorpore à sopa. Ao levantar fervura, aumente o fogo e acrescente com cuidado todas as orelhas dentro do caldeirão.
Quando ferver novamente, baixe o fogo e deixe cozinhar. Por ser uma massa muito fresca, não demora muito (em torno de 20 min). Desligue o fogo e frite todo o alho restante com azeite numa frigideira. Acrescente à sopa, mexa delicadamente, acerte o sal, tampe a panela e deixe descansar por uns 10 min pelo menos. Sirva como prato único. Na mesa, deixe à disposição limão, azeite, pimenta, sal.
Dica: faça este prato em dias mais frios, ou num ambiente com ar condicionado, porque ele provoca um suadouro que vou dizer….
Outra dica: você pode servir um vinho mais encorpado com este prato, pois ele não é nada leve! Da última vez que fizemos, nós harmonizamos com o Gavanza, da Rioja (espanhol), uva Tempranillo, safra 2006.
Nossa Lu, deu ” água na boca” e muita saudade de nossas orelhadas! Para quem não conhece vale a pena.
Morro de saudade da família inteira reunida!!!!!
Boa Noite… Bela Receita, deve ter ficado uma delicia. mais meu contato é para saber se onde voce comprou esse cortador de massa (redonda) possa ter mais do mesmo, pois estou procurando a dias e não se acha mais para comprar. Obrigado
Oi Vinícius! Infelizmente, não encontrei mais em lugar nenhum esse cortador. Comprei ele há uns 20 anos, nem lembro mais onde, e nunca mais encontrei! Qdo viajo para a Europa sempre procuro e até hoje nada…
Olá Vinicius, bom dia! Desculpe a demora em responder, estive ausente por um tempo… Infelizmente, esse cortador está mesmo difícil de ser encontrado. Eu mesma tenho procurado há uns 2 anos e não o encontro em lugar nenhum! Esse que eu tenho é antigo, tem mais de 15 anos, da Tramontina. Acho que não é mais fabricado. Já procurei em lojas especializadas em São Paulo, Paris e até Londres e nada… Caso eu o encontre por acaso, aviso a vc. E caso vc o encontre, por favor me avise!! Abs, Lu.
Tia Lu, quanta saudade do tempo que eu fazia parte dessa família maravilhosa! (Namorava com o Tito a 10 anos atrás, heheh) Fazer orelhada e tomar Bacardi com Coca-Zero ouvindo Tio Paulo contar piadas… Sempre tento marcar com Lua pra fazermos uma orelhada e matar a saudade do prato mais delicioso do mundo mas nunca rola, e as receitas que eu encontrava sempre eram diferentes, com coalhada seca e orelhinhas assadas antes de ir ao molho. Vou tentar fazer a sua receita qualquer dia com os amigos. Beijo grande!
Oi Dany!!! quanto tempo hein?!! Saudades!! Marque mesmo com Lua, ela sabe fazer direitinho a orelha de gato! Beijo grande pra vc!!
Lu Hazin,
estava procurando uma foto para mostrar aos amigos que não conhecem, e tive suas surpresa: primeiro o jeitão do prato (menos branco que os que vemos por aí), tal como minha mãe faz e o nome de “orelha de gato” que sempre adotamos.
Valeu mesmo
Marcelo Elihimas
Oi Marcelo!!! Surpresa fiquei eu agora!!! Vc disse que sua família adotava o nome de “orelha de gato” para este prato?! Eu sempre achei que havia sido criado dentro de nossa família… Que engraçado! Nós usamos o tahine e não coalhada para o molho, daí que não é tão branco.
A família Hazin é de Recife, eu que me desgarrei, rsrsrs. E vcs “Elihimas” são de onde?! A original era de Bethlem, Palestina.
Abs!! Lu Hazin.
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