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Doçuras e travessuras

Não sei se porque minha mãe nunca gostou muito de doces, nem de sobremesas (embora, no passado, tenha feito sucesso com algumas receitas maravilhosas, inclusive uma delas ganhadora de concurso recente em Recife), mas eu não fui criada como a maioria das pessoas no Brasil, mais especialmente no Nordeste, e ainda mais especialmente em Pernambuco, terra dos engenhos de açúcar, onde os doces são tão tradicionais.

Bolo de rolo, símbolo pernambucano, originado do “colchão-de-noiva” português, é Patrimônio Imaterial de Pernambuco. O mais tradicional é vendido na Casa dos Frios, em Recife

Só tínhamos sobremesas e doces em casa nos dias de festa, ou quando tínhamos alguma visita ilustre, merecedora do “privilégio”. Por isto, até hoje, quando frequento um restaurante, costumo me empolgar com as entradas e pratos principais, deixando o trabalho final de escolher uma sobremesa no cardápio para o meu marido. Ele decide e eu dou apenas uma “experimentada”, com aquela colherzinha extra que os garçons mais cuidadosos já trazem automaticamente. Em pouquíssimas ocasiões, esta “experimentada” ultrapassou duas ou três colheradas.

Queria registrar aqui que o brigadeiro foi o único doce que posso dizer que marcou a minha infância (a minha e a de bilhões de crianças brasileiras por gerações a fio). Eu e meus irmãos às vezes costumávamos, no meio da tarde, preparar um brigadeiro. Dividíamos em pratinhos, com porções milimetricamente idênticas, e saboreávamos de colher, bem devagarinho, pra durar o máximo possível. Ai que saudade… do brigadeiro e dos irmãos!!!

Mas enfim, sabemos todos que a tradição de se preparar doces e sobremesas veio de Portugal, que aliás nos apresentou o açúcar, desconhecido dos nossos índios. Os doces portugueses são na maioria exageradamente doces, o que também influenciou nossas próprias preparações. Para o padrão europeu, nossos doces mascaram demais os ingredientes (frutas, milho, mandioca, etc), e por nossa vez, achamos que as obras primas de confeiteiros europeus são “pouco doces”.

Luís da Câmara Cascudo, em seu livro “História da Alimentação no Brasil”, cita os engraçados nomes do doces portugueses e que muitos terminaram ficando por aqui: suspiros, esquecidos, beijos, sonhos, ciúmes, melindres, casadinhos, bem-casados, viuvinhas, beijos-de-freira, barriga-de-freira, toucinho-do-céu, papo-de-anjo, manjar-do-céu, baba-de-moça, fatias-de-parida, etc. Além das frutas cristalizadas no açúcar, como a perada, pinhoada, marmelada, laranjada, e …, palavras do historiador, a “réplica brasileira: – a cocada!!”.

Aproveitando dezenas de experiências que fiz em casa, com objetivo de preparar uma aula, postarei hoje uma deliciosa receita de cocada de maracujá que desenvolvi a partir de outras receitas que encontrei em livros e na internet. O azedo do maracujá “disfarça” um pouco o exagero do açúcar!

Cocada mole de maracujá

Cocada Mole de Maracujá

Ingredientes: 150g de açúcar, 90ml de polpa de maracujá (com sementes), 100g de côco fresco ralado

Modo de preparo:

Pegue um maracujá grande e coloque toda a sua polpa em uma peneira. Pegue um pouco do açúcar e com uma colher misture com a polpa e vá retirando o sumo da fruta. Acrescente parte dos caroços também. Em uma panela misture o açúcar e a polpa do maracujá e leve ao fogo baixo, até que derreta todo o açúcar (8 a 10 min). Acrescente o côco e deixe cozinhar em fogo brando por uns 10 ou 12 min, mexendo sempre. Retire do fogo e em colheradas, vá colocando porções em cima de um papel manteiga, ou em copinhos para servir com colher. Deixe esfriar.

Semana santa em Recife – Parte 1

Fui a Recife semana passada, dia 1º de abril, fazer uma visitinha à minha mãe que está fazendo 81 anos hoje. E já fui preparada pra invadir a sua cozinha! Levei de presente rolo para massas, aro redondo, pão-duro e alguns ingredientes, tipo tehine, linguiça e chouriço portugueses, além das folhas de uva compradas no Mercadão de São Paulo.

Como eu cheguei no domingo em cima da hora do almoço (e não teria tempo de preparar nada), minha mãe já havia providenciado uma suculenta língua de boi guisada, com purê e arroz, com o mesmo gostinho de quando eu era criança. Uma delícia. E pra fechar, meu irmão Sérgio, cozinheiro de mão cheia também (ele é especialista em peixes e frutos do mar) havia preparado pastéis de nata, receita de nossa avó. Muuuito gostosos!! Não posso deixar de divulgar esta receita pra vocês. Segue:

Pastéis de nata feitos por meu irmão Sérgio

Pastel de Nata:

Ingredientes da Masssa:

1 ovo inteiro – 50g de manteiga – 100g de açúcar refinado – farinha de trigo (até soltar das mãos)

Ingredientes do recheio:

8 gemas – 300g de açúcar refinado – 3 copos de leite de vaca (600 ml) – 1 colher chá de maizena – casca de 1 limão

Modo de preparo: Misture as gemas com o leite frio, passe duas vezes na peneira fina e depois adicione o açúcar, a casca de limão e a maizena. Fogo brando até fumaçar e ganhar consistência. Deixe esfriar um pouco. Enquanto isso, faça a massa e forre as forminhas. Depois derrame o recheio nas forminhas já forradas de massa e leve ao forno até dourar as bordas dos pastéis.

Delícia!

No dia seguinte, 2ª feira, lá fui eu com Sérgio ao supermercado fazer compras básicas, tipo: um pato, temperos, ervas, verduras e cervejas (aliás, adorei a cerveja recentemente lançada por lá, chamada Proibida, produzida no Ceará).

Cerveja “Proibida”

Então preparei um arroz de pato, que ficou muito bom, baseada na receita que está no blog de um amigo e professor de gastronomia da UNIRIO, Chef André Leite. Foi um sucesso lá em casa. Minha mãe e 3 irmãos aprovaram. Só não botei os ovos cozidos, sei lá, acho que não combina muito. Mas fica a critério.

Arroz de pato

Na 3ª feira, outra maratona! Resolvi voltar às origens árabes. Fomos cedo ao Mercado de Casa Amarela, antigão, existe desde 1930. Primeira coisa que vi: montes de bichos vivos, tipo pato, carneiro, cabra, bode, galinhas. Uma coisa que eu até já tinha esquecido que existia por lá. Me deu tanta pena dos bichinhos… mas enfim… compramos uma paleta de carneiro completa, da canela até as costelas! Pedimos ao açougueiro para cortar tudo em pedaços. Em casa, descarnamos tudo e com os ossos fizemos um belo de um caldo. A carne foi toda picada na ponta da faca. Com isto, fizemos charutos de repolho e de uva, misturados em uma só panela. Neste dia, foram almoçar lá vários sobrinhos, irmãos e cunhada. Sucesso novamente. De sobremesa, um típico bolo de rolo (Patrimônio Imaterial de Pernambuco).

Charutos de folha de uva

Bolo de rolo

E dando prosseguimento à maratona, aproveitando o caldo e a carne picada de carneiro, à noite ainda preparamos “orelha de gato”, apelido dado por nossa avó árabe ao “Chich barak”. Um dia farei um post exclusivo para explicar o passo-a-passo desta receita incrível.

Mas de todas as “orelhas” que já comi, esta foi sem dúvida a melhor!

“Orelha de gato” – Chich Barak